Quebra de patentes: Congresso adia, mais uma vez, derrubada de veto de Bolsonaro pela liberação de genéricos e vacinas contra a Covid-19
18 de março de 2022Por causa do veto à Lei das Licenças, o Brasil continuará sem os novos medicamentos para o tratamento da Covid; especialistas, organizações sociais e sindicatos e federações de trabalhadores da saúde afirmam que adiamento só favorece lucros de grandes laboratórios, enquanto vítimas da doença morrem nos hospitais sem acesso aos novos recursos
O Congresso Nacional voltou a adiar a votação sobre o veto do presidente Jair Bolsonaro à Lei 14.200, de setembro de 2021. A liberação de patentes durante a pandemia, para a produção de vacinas, testes e os novos medicamentos que tratam a doença, já aprovada pela Câmara e o Senado, vem sendo postergada seguidamente, desde outubro.
O Conselho Nacional de Saúde (CNS) recomendou a derrubada do veto e mais de 100 organizações brasileiras e estrangeiras lamentaram o novo adiamento, anunciando que seguirão em campanha pela derrubada urgente do chamado Veto 48. Nova sessão conjunta do Congresso deve ocorrer na próxima semana.
Caso o Congresso derrube o veto, a nova legislação ajudará o Brasil a garantir o acesso a versões genéricas e biossimilares de produtos de combate à Covid-19, como vacinas, testes e novos medicamentos, já recomendados pela Organização Mundial de Saúde e pelas agências americana e europeia.
A Lei das Licenças prevê que o governo formule uma listagem dos produtos para o enfrentamento da doença em uma emergência nacional de saúde. Os produtos elegidos após consultas e análises técnicas serão licenciados.
Além das fórmulas, deverão ser compartilhados os conhecimentos e fornecidos materiais biológicos. Os laboratórios detentores das patentes receberão royalties dos concorrentes.
Além de abrir a possibilidade de produção própria, com o licenciamento o Brasil também poderá comprar já genéricos do último tratamento recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), o Baricitinibe, para tratamento de casos graves.
Também será possível comprar versões genéricas de tratamentos aprovados nos EUA e Europa para tratamento da doença na etapa inicial, como o Paxlovid e o molnupiravir, da Merck, apesar de ter sido excluído da lista de 95 países autorizados em novembro a comprar versões genéricas via acordos de licença voluntário, conforme acordo dos laboratórios com o Pool de Patentes para Medicamentos (MPP, sigla em inglês), uma instituição de saúde pública da Organização das Nações Unidas (ONU).
O GTPI (Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual) lidera a coalizão “Vacina para todos e todas”, que congrega 18 organizações brasileiras defensoras do uso da licença compulsória.
A coalizão, que ganhou o apoio de 120 organizações brasileiras e estrangeiras em defesa da Lei, lamentou a ação dos parlamentares brasileiros.
Lucros ou vidas
O coordenador do GTPI, Felipe Carvalho, afirma que os laboratórios não podem seguir focados somente na ampliação de seus lucros em meio a uma pandemia.
“Fazem um tipo de terrorismo ao afirmar que a lei causaria insegurança jurídica e o Brasil poderia ser preterido na distribuição de vacinas e remédios. Não poderiam fazer isso.
Até porque esses laboratórios até hoje não estão conseguindo produzir as demandas globais que lhes têm chegado.
Enquanto calculam seus lucros futuros, nós estamos perdendo muitas vidas. Por isso esses vetos precisam ser derrubados logo”, disse Carvalho.
A indústria farmacêutica tem argumentado que não há aplicação para a nova lei no Brasil porque não haveria pedidos de patentes depositados no país, mas essa afirmação não se sustenta.
No país já há possibilidade para a aplicação da licença compulsória em diversos casos.
No Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), órgão que analisa e aprova patentes, já constam pelo menos cinco pedidos de patentes para o medicamento molnupiravir, quatro para a vacina da Janssen e três para a vacina da Moderna.
Além disso, pelo menos 30 empresas estrangeiras já indicaram sua capacidade de produção de vacinas e remédios, quando houver a liberação das patentes e conhecimentos.
O licenciamento compulsório de produtos de enfrentamento à Covid já foi feito por outros países, como Israel, Indonésia e Rússia, e tem sido defendido por outros, inclusive Canadá e Estados Unidos.
Para o GTPI, o Brasil passaria a dar um exemplo global e contribuiria para os esforços de países como Índia e África do Sul no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), que tem tentado favorecer o acesso mais equitativo às vacinas contra a covid-19.
“Sem os vetos, esperamos ver a disponibilidade de versões genéricas acessíveis com garantia de qualidade de tratamentos para a Covid-19 aprovados pela OMS, como o baricitinibe, tocilizumabe, sarilumabe e casirivimabe/imdevimabe, junto com sua inclusão nas diretrizes de tratamento nacional, o que pode ajudar a melhorar o atendimento ao paciente, visto que o Brasil registra um dos maiores índices de mortalidade do mundo na pandemia.
E o Brasil reforçará com um bom exemplo os encaminhamentos da OMS.”, disse Carvalho, mestre em Economia Política Internacional e coordenador de Campanhas de Médicos Sem Fronteiras (MSF).
Integram as ações do GTPI organizações como Anistia Internacional, Médicos Sem Fronteiras (MSF), Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, Oxfam Brasil, Inesc, Ibase, Conectas, Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid-19, Ação Educativa, Ação Brasileira de Combate às Desigualdades (ABCD) – e as internacionais, como International Treatment Preparedness Coalition, Public Citzen (EUA), Just treatment (Reino Unido), Health Gap (EUA) e Public Eye (Suíça).
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