Saudade é recordar: 40 anos sem Elis Regina

19 de janeiro de 2022 0 Por diadianews
Há 40 anos o Brasil perdia Elis Regina, uma de suas maiores intérpretes. Várias produções sobre ela estão a caminho, e algumas já estarão disponíveis hoje
19/01/2022 09:30 – Eduardo Miranda – Correio do Estado

Há 40 anos o Brasil perdia Elis Regina, uma de suas maiores intérpretes. Várias produções sobre ela estão a caminho, e algumas já estarão disponíveis hoje – Paulo Kawall

“Saudade É Recordar” esse é o nome de uma canção lançada por Elis Regina há 60 anos. O termo também é oportuno para que a recordação da trajetória da cantora esteja presente em uma outra data, lembrada neste 19 de janeiro: os 40 anos da morte da intérprete.  

São muitos os projetos que serão lançados entre hoje e o próximo ano para que a cantora, uma das maiores da história da música brasileira, se mantenha ainda mais presente em nosso cotidiano. 

“Quarenta anos de morte não, de saudade de Elis”, prefere dizer seu filho João Marcello Bôscoli. Há produtos ligados ao audiovisual e também aos quadrinhos. Confira a seguir.  

Saudade

O portal do Itaú Cultural (www.itaucultural.com.br) estreia hoje um material especial, que compartilhará com o público um amplo conteúdo sobre a trajetória de Elis. 

A produção também mergulha nos caminhos que conduziram os jornalistas Danilo Casaletti e Renato Vieira ao projeto “Elis, Essa Saudade…”, da Warner Music Brasil.

A coletânea, lançada em formato físico e digital, reúne 16 canções interpretadas por ela, entre clássicos como “O Bêbado e a Equilibrista”, de Aldir Blanc e João Bosco, e a inédita em CD “Pequeno Exilado”, composição do conterrâneo Raul Ellwanger, com quem Elis divide os vocais na gravação.

No extenso verbete sobre Elis Regina disponível na Enciclopédia Itaú Cultural (enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa539908/elis-regina), o público pode conhecer mais sobre como a gaúcha Elis Regina Carvalho Costa (1945-1982), que ouvia Cauby Peixoto e Ângela Maria, se transformou em Elis Regina, artista que valorizou novos compositores e apontou caminhos para a música popular brasileira. 

O material conta, ainda, com informações sobre discos de Elis, como “Falso Brilhante”, lançado pela gravadora Philips em 1976, e exposições realizadas sobre a cantora.

Elis, presente

A luz maior do especial do site do Itaú Cultural, no entanto, fica por conta de uma conversa com Danilo Casaletti, que, com o também jornalista Renato Vieira, traz um olhar mais recente à obra de Elis Regina, com a coletânea “Elis, Essa Saudade…”.

O álbum reúne tanto clássicos quanto canções pouco conhecidas do trabalho da artista. 

Na matéria, Casaletti conta sobre a construção do projeto, que nasceu com a proposta de ser tanto físico quanto digital, abrangendo todas as vantagens dos dois formatos: desde encarte com as letras das músicas até a disponibilização do material em plataformas digitais.

As 16 interpretações de Elis que integram o álbum vêm de gravações em estúdio e de registros em eventos como o Montreux Jazz Festival. Os idealizadores, no entanto, não abriram mão de buscar diferenciais e outros olhares para o disco.

Foi assim que integraram ao set list “Pequeno Exilado”, canção de Raul Ellwanger gravada por ele e Elis em 1980, até então inédita em CD. Outro diferencial, como conta Casaletti na matéria, foi a saga pela foto da capa do disco. 

Em busca de estampar no álbum o sorriso marcante da artista, os organizadores foram atrás de um registro de Elis – nunca antes divulgado – feito pelo fotógrafo Paulo Kawall, que não tinha mais a fotografia original. Mas, por sorte do destino, um amigo do jornalista havia comprado a imagem e cedeu o material para compor o disco.

O resultado final do trabalho pode ser ouvido no link do disco no Spotify.  

O que há por vir

Outros projetos sobre a artista são ligados ao audiovisual: um documentário em três episódios, a ser lançado pela HBO, vai levar o nome de “Elis por João”, com imagens de programas, shows e entrevistas que Elis concedeu para emissoras de vários países. 

O produtor é Marcelo Braga, e a direção ficou com Lea Van Steen. A progressão das cenas terá um eixo cronológico baseado na narrativa muitas vezes emocionada de João Marcello. Imagens de Elis conseguidas por Braga a mostram em aparições nas TVs de países como Bélgica, França, Portugal, México e Alemanha.

O segundo projeto, em fase de finalização, aguardado pelos fãs há anos, é também um documentário gravado pelo produtor Roberto de Oliveira durante os registros, em Los Angeles, nos Estados Unidos, do álbum “Elis & Tom”, lançado em 1974. Roberto tem um material bruto de 3h30min em vídeo e mais quatro horas em áudio guardados desde então.  

Agora, editados, eles estão prontos para surgir no longa-metragem “Elis & Tom – Só Tinha de Ser com Você”, pelo canal Arte 1. A expectativa é de que saia no segundo semestre. “Estamos na fase final, mas gostaríamos de lançar quando a pandemia estiver mais controlada, para fazermos um evento presencial”, diz o produtor.

Documentário

O especial de Elis feito com a coprodutora HBO é fruto do esforço do produtor Marcelo Braga. “Ele vasculhou os arquivos mesmo”, diz João Marcello. Braga conta que, para ele, “o grande diferencial são as memórias de filho narradas por João”. 

O especial, que será mostrado em três capítulos em data ainda não definida, conta, conforme diz Marcelo, com muita sensibilidade da diretora Lea Van Steen. “Ela trouxe um olhar feminino, de fã de Elis, mas também de uma grande documentarista”.

ELIS & TOM  

Em 1974, Roberto de Oliveira sentiu que deveria registrar o momento histórico que testemunharia como produtor. 

Depois de ajudar a costurar o encontro entre Elis e Tom Jobim em um estúdio nos Estados Unidos, onde o álbum “Elis & Tom” seria gravado para, de fato, não sair mais da história, ligou para dois brasileiros que trabalhavam com cinema por lá, Jom Tob Azulay e Fernando Duarte, e montou uma equipe para registrar os bastidores da gravação. 

Mas, ao contrário do que o mundo conheceu recentemente com o excepcional “Get Back”, de Peter Jackson, aquele não era um projeto voltado para as câmeras.

“O que importava ali era o álbum. Quando entrávamos no estúdio com o equipamento, tínhamos de ter muita discrição”, conta Roberto. 

Assim sendo, Elis, Tom e os músicos são flagrados discutindo sobre os arranjos das músicas, às vezes com alguma tensão (isso no início, quando Tom ficou ressabiado ao saber que Cesar Camargo Mariano seria o arranjador) e diversão (o que é, talvez, um dos aspectos mais saborosos do material). “Ninguém ali estava preocupado com as câmeras”, conta Roberto.

Sobre uma segunda menção, quando lembrado de que o filme de Peter Jackson mostra o parto ao vivo da música “Get Back”, saindo de Paul McCartney aos poucos e fazendo o espectador torcer para que ele encontre a nota que, evidentemente, logo encontraria, Roberto diz: “Ah, essa sensação existe por várias vezes no filme de Elis e Tom também”.

 Em uma delas, antes de cantarem “Chovendo na Roseira”, Tom fala para Elis algo como: “Vamos descontrair, ficar mais soltos. Não quero cantar igual ao Tom Jobim”. Uma constatação que Roberto de Oliveira pode adiantar: “Todo o disco saiu exatamente como Tom Jobim queria”.  

Quadrinhos

E a terceira empreitada, em uma frente inédita para os fãs da cantora, trata-se da criação da personagem de Elis para uma história em quadrinhos, desenvolvida pelo desenhista Gustavo Duarte, 44 anos, um dos mais respeitados quadrinistas e cartunistas brasileiros, com trabalhos realizados para os estúdios internacionais Marvel e DC Comics.

Com 15 anos como chargista e desenvolvendo histórias para super-heróis fictícios, como Super-Homem e Mulher-Maravilha, ele tem sua primeira experiência com um personagem real. 

“Isso não quer dizer que eu vá fazer uma biografia de Elis, isso já fizeram. Meu papel não será o de um biógrafo, o que vou fazer será uma fantasia biográfica”. O livro, em fase de roteirização, terá cerca de 80 páginas e virá em formato europeu, como as publicações de Asterix e Tintim. O autor prevê o lançamento para o segundo semestre ou para o início de 2023.

A história de Elis, diz Gustavo, não será pensada para conversar só com as crianças, apesar de serem elas o primeiro alvo. A fantasia terá como gatilhos fatos conhecidos da história. 

A cantora criança está, em 1955, ouvindo discos na sala de sua casa, em Porto Alegre, quando recebe a visita de um pássaro falante. Elis se encanta e conta ao amigo novo que, apesar de ser uma atração conhecida no programa Clube do Guri, da Rádio Farroupilha, é apenas uma menina, e o pássaro responde: “Mesmo sendo Elis uma criança, sua voz já encanta milhares de pessoas”.

E mais: no mundo de onde ele vem, música é o que mantém tudo em harmonia. 

Então, o pássaro convida Elis a conhecer esse mundo e a conduz por um portal, abrindo a tampa do toca-discos. Elis, a partir daí, viaja por passagens curiosas, como a que encontra, em uma esquina de Belo Horizonte, um garoto negro de boina, Milton Nascimento, e se assusta quando os abutres, os militares que tomam o País com o golpe de 1964, prendem uma alienígena, que, na verdade, é uma cantora famosa a ser libertada pela pequena Elis: Rita Lee. 

“É uma história para que adultos e crianças que não saibam de Elis possam também entender que esse personagem e esse mundo fantástico existiram”, resume Gustavo.

*Com Agências 

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